terça-feira, 25 de agosto de 2009

Um desabafo contra a religiosidade farisaica


Padres, padres e mais padres tomam a cidade outrora pacata. A todo instante algum sabedor de religião diz ser dono da palavra verdadeira, da última palavra em religião, da encarnação da palavra, e por aí vai. São eles todos doutores! Nefastos e idiotas doutores com toda sua pompa, sua audácia malfazeja, seu caráter mesquinho, pequeno burguês, hediondo contra um raro espírito livre nesse mesmo lugar outrora pacato. Esses pulhas invadem até o silêncio da madrugada arvorando-se donos de algo que jamais podem ou poderão controlar, apenas habitar, invadir, tal qual os portugueses realizaram aos humanos que aqui já habitavam e foram todos violentados em todos os aspectos. Vestem-se com toda a pompa, com toda a soberba, com todo o invólucro de falsidade, de enganação, e o que é pior, ludibriam e expropriam as pobres almas que fazem questão de serem pobres almas, de estarem ali, reclusos e apequenados em suas desumanidades corriqueiras, cotidianas, acreditando que Deus acredita neles, "porque o padre assim o disse..." Estúpidos todos! Que morram nisso que chamam de vida provida de algo distorcido que eles insistem em chamar de liberdade! Ligo a mínima! Estou cansado dessa briga de ninguém, dessa ideologia imunda e ao mesmo tempo emancipadora que não ajuda a ninguém que não a queira. Por que tem que ser dessa forma? Por que os estúpidos sentem-se atraídos pelos estúpidos? Por que obrigar, de modo sucinto, mas fatal, aqueles ditos jovens, habituados ao único momento efetivamente livre de suas vidas predestinadas ao fracasso, à burocracia, às estatísticas, enfim, ao nada, a fazerem algo que lhes doem a alma. "Gostem de Deus que Ele gostará de vocês!" É mentira! Tudo não passa de mais um engodo! Deus não ama ninguém a não ser a si mesmo! Por isso idolatra-se e pede idolatria; por isso deseja que todos façam algo por Ele, em nome dEle, seja para o mal ou para bem, não importa! Apenas usem o nome dEle e lembrem-se sempre que Ele é o superior e que eles, vocês, nós, não passamos de uma cópia mal sucedida, mal acabada de uma tentativa de sermos deuses. Mas eles, vocês, nós somos todos deuses!

E o maldito burguês de preto com seu "chapeuzinho de cuia" chega em seu automóvel estupidamente limpo por alguém que achou estar fazendo uma boa ação ao santo homem quando lhe permitiu que lavasse seu automóvel. Ele é um bispo, alguém tido como especial porque é um dos emissários diretos de Deus aos "homens de bom coração". E os coitados, esfomeados, retirantes espirituais, crêem nisso tal qual o dia nasça amanhã. Chegam a dar seu findo dinheiro em nome de uma festa também estúpida, já que é organizado por homens de almas estúpidas, na busca de estarem praticando uma boa ação. Isso não é uma boa ação! Não passa de um atestado de mediocridade, de aceitação de inferioridade que eles querem que todos a tenham que nem a porra de um câncer espalhado pelo corpo todo há muito tempo. Aquele odor que é exalado de suas vestes pretas, que simbolizam a pureza, o respeito para com aquele ser dito maior, não passa de um casulo, de uma crisálida, de um recipiente em que se guarda tudo que é de podre daquilo que chamamos "humano". Aposto que se Deus existisse ele reprovaria tal comportamento soberbo, luxurioso, de desfilar sob roupas pomposas para chamar a atenção do coitado, em todos os sentidos, para que ele lhe diga: "Olha, ali vai um enviado divino!". Divino do inferno, só se for. Não passa de um demoniozinho de quinta categoria tentando equiparar-se ao próprio Lúcifer em maldades que ele teima que sejam bondades. O diabo não acha que pratica maldade alguma, pelo contrário, é só observar porque ele ri. E o pobre Deus o faz assim? Aprendemos que não. Deus jamais ri de nada, se o fizer será um louco, todos devemos então seguir mais esse mandamento subentendido nas entrelinhas de sua doutrina desumana e exercitar todos os domingos nossa tristeza imposta – a verdadeira "essência do cristianismo". Se bem que nos será permitido estarmos alegres somente em casos de pura estupidez, já que se está no meio de estúpidos, então poderemos saltitar, dançar, proferir músicas (se é que o são) de letras medíocres e rezar também mediocremente, pois um campeonato de rezas de vez em quando ajuda a nos levar à redenção, a estar mais próximos de Deus, de preferência na igreja, ao lado daquele que se diz o oficial imediato do grande nada que insistem em chamar de DEUS! Esse deus que eles tanto falam não existe! Um produto, aliás, um produto muito bem elaborado ao longo de centenas de anos; uma marca muito bem desenvolvida que lhes permite lucros exorbitantes durante eras incontáveis em lugares inimagináveis! A maior empresa do mundo: a igreja católica apostólica romana! Produto principal: Deus. Segmentos desse produto: Jesus, o que dizem Cristo, e seus asseclas, santos, santas e beatos, afora os que o povo adora como tais mesmo sem a aprovação estúpida dos homens estúpidos daquele antro chamado Vaticano, lugar onde estão escondidos e muito bem guardados os espólios de incontáveis épocas sobre os mais diversos povos nas mais diversas regiões do planeta. Sim, eles podem tudo, eles são tudo, diria até o mais estúpido de todos os fiéis.


sábado, 22 de agosto de 2009

Uma verdadeira oração para Deus

Quão gozosos se encontram os seres humanos quando descobrem que estão sob o jugo da paixão, quando se veem enamorados por alguém e esse alguém retribui o mesmo sentimento que lhe foi dado! Ambos parecem caminhar por sobre as nuvens galgando mais e mais para ficarem próximos do Ser Divino! Experimentam sentimentos nunca antes sentidos e descobrem-se acima de tudo vulneráveis aos caprichos do outro, do outro que lhe é o objeto de adoração, de amor... Para esses seres humanos "tudo é lindo, tudo é maravilhoso" – até a "pieguice"; onde havia sofrimento, reina agora alegria, o êxtase espiritual! Querem contar a tudo e a todos o quão de felicidade toma cada vez mais seu coração, sua alma, seu ser... É algo comparável àquele fiel, devoto fervoroso de sua religião, que descobre nela a certeza que o aproximará ao seu objeto de adoração, que levará ao seu deus – coisa que se nota como principal meta a qualquer religião verdadeira e que é justamente alcançar a divindade. Este é o perfil de um ser humano verdadeiramente apaixonado, daquele ser humano que indiscutivelmente está amando. E é neste sentimento, nesta transição aparentemente infinita de sensações, que ele encontrará o seu objeto de adoração, no caso, o seu "deus". É através deste sentimento, o amor, que se pode afirmar de modo convicto o caminho pelo qual se pode aproximar ao máximo da divindade. É este o verdadeiro poder, a verdadeira magia sacra, divina e religiosa; a única maneira de se fazer uma "oração a Deus".

quinta-feira, 13 de agosto de 2009

A verdadeira religião e uma religião que apequena o ser humano


A religião, embora seja um tema há muito discutido e re-discutido e pensado e re-pensado, ainda assim consegue ouriçar as pessoas no nosso mundo, sejam elas de qualquer raça, credo ou classe social. Até os menos inteligentes, os que não buscaram se aprofundar de uma maneira um tanto mais rebuscada sobre este tema, acham-se grandes sabedores, eloqüentes conhecedores deste tema tão vasto senão complexo. Absolutamente todo mundo possui uma opinião formada sobre a religião e muitos ainda não admitem que ninguém discorde posto que "a minha opinião é fundamentada naquilo que o padre ou o pastor falou". Deveriam ler mais. Estes grandes sabedores da religião, embora tenham toda crença possível e impossível que a sua escolha ou impressão – que seria o termo mais conveniente – sobre religião é perfeita e praticamente inabalável, acreditam-se no direito legítimo, ou até mesmo "divino", de tratarem sobre esse assunto como se fossem um santo Agostinho, um Lutero ou até mesmo um Papa qualquer. Esses incautos que lêem e apenas compreende de maneira medíocre um trecho qualquer da Bíblia já querem que as pessoas imediatamente percebam sua "grande descoberta" acreditando piamente senão cegamente que os outros necessitam desesperadamente de sua revelação, de sua salvação! Idiotas, idiotas, idiotas! Eles confundem religião com imposição, para eles são sinônimos, como também seria sinônimo o desrespeito para com as concepções dos outros, dogmatismo abusivo e exagerado. Por que essas pessoas têm que levar ao pé da letra o que está escrito em qualquer bíblia traduzida por qualquer um? "Não! A tradução da minha bíblia é muito melhor e mais aprofundada que a sua!", ou ainda: "A minha vem direto da Revelação de Deus feita para o Homem, a sua não!" e por aí vai as sandices que cada um acha estar correto quando na realidade não percebem nenhum deles que a fé estaria atrapalhando muito mais uma possível compreensão exata deste livro sagrado – isto é, se existe esse tipo de compreensão sobre esta obra, quando na realidade seria muito mais interessante se todos complementassem suas compreensões pois é muito mais prático falar em diferentes interpretações do que "eu conheço a verdade absoluta" que muitos apregoam por aí. Se bem que isto é típico de um tipo de conhecimento, no caso o religioso, que só admite gentes escolhidas, pessoas indicadas pelo divino para ter acesso a essa Verdade, então, nada mais saudável que a maioria desses grandes sabedores pretenderem ser este escolhido, não?

Um pequeno grande filósofo, desconhecido praticamente para os iniciantes ou curiosos e que passa quase despercebido pela história da filosofia, não fosse o reconhecimento dado a ele por um filósofo ilustre, o senhor Karl Marx, reconhece na figura de Ludwig Andréas Feuerbach um pensamento no mínimo inquietante. Feuerbach fora mais um dentre muitos outros que comentou sobre este tema demonstrando o quão de complexidade ele exige, lembrando ainda que este ilustre desconhecido pensador fora um teólogo que mais tarde arrependera-se "formalmente" desta sua escolha percebendo justamente a complexidade do tema e, portanto não mais ofertando o devido crédito que os doutos cristãos pretendiam. Este pensador, cuja vida nos serve de exemplo de o quanto um ser humano pode sofrer por causa de meia dúzia de idéias "incendiárias", e isso no início do século XIX, numa Alemanha ávida por ingressar de uma vez por todas no progresso industrial, conseguiu convencer Marx e Engels do caráter de encantamento – de "alienação" mesmo – existente na esfera da religião. A religião funcionou como ponto de partida para a compreensão de que este caráter de alienação estaria espraiando-se para outros ambientes, no caso, nas relações sociais entre pessoas de classes distintas.

Como disse anteriormente, esse tema atrai muitas pessoas. Sinto isso na sala de aula, nas conversas com amigos, na televisão. O tema consegue atrair muito mais do que imaginamos, talvez atraia tanto que seja por isso que vemos a todo o momento espalhados pela tevê indivíduos que se tornam símbolos consagrados de um produto justamente derivado da religião: a fé. Esses muitos indivíduos que lêem e apenas compreendem de maneira quase medíocre um trechinho mixuruca das ditas sagradas escrituras, imediatamente sentem-se arrebatados por uma inspiração divina e assim pretendem que as pessoas logo os tomem como enviados diretos da divindade maior. Acreditam que foram tocados pelo sagrado e por isso foram salvos, e agora possuem uma missão aqui na terra mundana de salvar a nós, os que ainda buscamos essa dita verdade suprema. Mil vezes idiotas!

Será que religião, para eles, é tão somente sinônimo de imposição, de dogmatismo puro, abusivo e exagerado? De desrespeito para com as concepções dos outros se essas concepções vão de encontro às suas? Por que esses estúpidos palermas acreditam que a Bíblia, a Torá ou o Corão lhes serve como o mais eficiente cabresto? Por que eles encontram em sua suposta certeza a "revelação" mais que sagrada sobre o maior mistério da vida? Chega a ser um tanto assustador quando nos deparamos com seres dessa estirpe, pois serão eles em um futuro muito próximo belos ditadores, déspotas, fascistas ou qualquer outra desgraça humana justamente voltada para algo anti-humano. A dúvida, para eles, age tal como uma cruz para um vampiro; fogem como crianças assustadas de um monstro que está no armário. Parece que, ao perceber remotamente que uma dúvida está prestes a lhes incorrer a mente, o espírito, uma grave doença lhes dominará o corpo. Fecham-se em seus casulos, em suas crisálidas, acreditando piamente que o mundo é aquilo que suas enrugadas mãos alcançam. E quando vêem alguém que não almeja enxergar aquilo com o qual eles já se habituaram, taxam-no de desviado, de incrédulo, ou até de adorador de alguma entidade malévola - como que se tais entidades tivessem alguma relação com a mediocridade de espírito deles -, julgam-no precipitadamente sem sequer ouvirem o que o outro tem a dizer. Eis, então, que surge o grande dilema: em que categoria colocar essa gente desrespeitosa e nada religiosa, se tomarmos o sentido originário deste termo tão solapado? Será, por exemplo, que o Cristo manifestava uma proposta de tornar as pessoas fechadas para o mundo e para os outros, fechadas no sentido de afirmarem que uns poucos têm a verdade e os que não têm deveriam ser perseguidos - aliás, vale lembrar que ele próprio fora um desses perseguidos -, execrados da sociedade? Será que o Cristo pretendia salvar o mundo dos homens para que alguns poucos pudessem encontrar a verdade e assim esses poucos deveriam subjugar a grande maioria supostamente perdida? Ser crédulo é sinônimo de estupidez, de idiotice aguda? Será que esses indivíduos possuem alguma dificuldade em perceber que religião envolve conceitos fundamentais como fraternidade, irmandade ou, no mínimo, respeito para com o outro? Até o próprio Nietzsche, tão perseguido por esses grandes sabedores da religião e por esses mesmos perseguidores que o taxaram de herege ou demoníaco, possuía algo que eles jamais manifestariam e que é justamente o princípio de humanidade, de respeito para com o ser humano e inclusive com a natureza, coisa que a filosofia tradicional daquele momento não reconhecia, representada na figura maior de Hegel. Nietzsche chama a atenção para que o próprio ser humano identifique dentro de si esse princípio verdadeiramente supremo ou até divino, pois pertence à sua natureza, reconhecer que o outro tem um valor tal em relação a qualquer um e coisa. É reconhecer que o diferente existe e deve ser visto como diferente, não com uma visão de reducionismo, de preconceito, "farisaica"; é tão somente reconhecer que o diferente é diferente e que isso não suscita direito algum de menosprezo. Já Hegel, por mais notável e brilhante que tenha sido sua filosofia, por exemplo, enxergava o negro como um ser inferior - como antítese, segundo sua nomenclatura filosófica - ávido por relacionar-se com o branco, pois somente este o "salvaria" do estado de barbárie em que ele próprio e seu mundo se encontravam; ou ainda, afirmar que o cristianismo é a religião "maior por excelência", pois somente ela é quem de fato consegue a incrível façanha de lidar com o conceito. Concordo veementemente que Hegel contribuiu e ainda contribui com sua filosofia para uma compreensão mais acurada da nossa realidade servindo-nos com seu arcabouço, com sua estrutura que consegue adaptar-se dialeticamente a qualquer período em que a nossa história esteja, não obstante, sua contribuição, para aquela época, já era muito arriscada, senão efetivamente imperialista, ostentadora da ideologia de políticas dominadoras que sequer apresentavam uma noção de respeitabilidade para com o outro, e dentre essas políticas, obviamente que se enquadra aqui o catolicismo ou o cristianismo de modo geral, de algum modo ganhando alguma legitimidade na filosofia hegeliana. Parafraseando Nietzsche, o ser humano não é melhor nem pior que uma simples formiga, ele, simplesmente, e assim como a formiga, realiza aquilo que sua natureza lhe permite e isso jamais lhe dará o direito de julgar-se superior a qualquer uma das criaturas da natureza maltratando-as de algum modo, e isto se dá também com o próprio ser humano - obviamente que isto se aplica a esses supostos religiosos que se acham no direito sagrado de serem superiores aos demais espraiando sua arrogância seguida de intolerância e desrespeito ignorando assim justamente esse aspecto da natureza assinalado por Nietzsche. Seria bem interessante que esses ditos homens da religião, em algum momento de suas maravilhosas vidas, dedicassem um pouco de seu precioso tempo à leitura de uma obra nietzschiana que consegue demonstrar o quão eles ainda têm muito que aprender sobre preceitos efetivamente religiosos. Seria tão bom se, com a mesma vontade que lêem a Bíblia, lessem algumas passagens do Anticristo, do Ecce Homo ou de outro filósofo "menor" como Feuerbach em a Essência da Religião e não ficassem presos às suas "robisonadas" religiosas, utilizando um termo da crítica marxista. Reconheço sim o quão pretensioso de minha parte imaginar que tais figuras pudessem de algum modo se debruçar sobre algo diferente de seu mundo e assim fortalecer - ou não - suas crenças naquilo que acreditam com tanto fervor. Sei que uma leitura desses indivíduos sobre a contribuição do velho Nietzsche ou do sofrido Feuerbach suscitaria julgamentos no mínimo desrespeitosos dirigidos às suas imagens desmerecendo assim pensamentos contundentes e efetivamente "religiosos", para não dizer humanitários.

quarta-feira, 5 de agosto de 2009

A condição do homem contemporâneo

Talvez seja uma pergunta supostamente tão simples e pretensiosa, mas que soa não menos absurda: será que a razão venceu? De fato, não podemos negar que o homem contemporâneo ou moderno goza de avanços tecnológicos outrora impensáveis ou simplesmente destituídos sequer de uma suposta aura de possibilidade. Pode-se transformar a natureza de um modo tão profundo que o próprio homem jamais sonharia possuir essa tal e incrível capacidade. Nesse sentido, a razão realmente conseguiu ofertar ao ser humano um avanço inominável, tornou-se um instrumento fantástico capaz de proporcionar os desejos supostamente irrealizáveis. Com ela, a razão, o homem alcança aquilo que a sua mão não lhe permite ofertando à sua mente poderes incomensuráveis. Não obstante, é essa mesma capacidade que o distanciaria de si mesmo impondo-lhe algo que o rejeita, que o faz desconhecer-se, enfim, que o aliena. Sim, o ser humano hodierno tem alcançado uma individualidade que o transforma, que o regenera até certo ponto, que o leva a lugares ou estádios jamais sonhados por ele mesmo. O ser humano, paulatinamente, vem-se tornando mais coeso em suas determinações, em suas escolhas, em sua própria vida, vem-se tornando um sujeito no real sentido da palavra se comparado a outros períodos históricos, como na Idade Média, por exemplo, em que falar em autonomia era quase uma heresia passível de condenação à danação eterna. Sim, o homem de hoje goza de benesses que o homem grego, com toda sua transformação política, não poderia ter, não apenas nas áreas das humanidades como também nas tecnológicas ou ainda naquilo que servia de auxílio no dia-a-dia. Atualmente se vive mais e melhor, dizem e re-afirmam os clichês propagandísticos dessa coisinha moderna chamada tevê que consegue seduzir tão fatalmente o passivo assistente. Mas, talvez seguindo o mesmo erro de Leibniz, o mundo de hoje, por mais que seja dotado de mil e uma maravilhas, de grandes vantagens se comparado ao humano do passado, ainda assim, esse mesmo ser humano incorre por perseguições ao seu espírito, à sua liberdade, à sua autonomia, e, por mais que se viva em um mundo que oferte todas as maravilhas necessárias à sua libertação enquanto sujeito efetivamente individual, no dizer adorniano, ainda assim se vê preso a novos grilhões. Na realidade, mais parece que se está em um mundo no qual os cerceamentos apenas mudaram de cor, de forma, de aparência, e pior, travestem-se como coisas pertencentes ao ser humano, como algo necessário, natural, conseguindo desse modo passar despercebido do olhar humano. A tecnologia desenvolvida atualmente exerce a mesma função que o pelourinho para os negros, óbvio que não mais de forma evidente e fácil de perceber, agora se dá em um aspecto mais cruel, pois prefere extirpar a vida do indivíduo – diga-se de passagem, de qualquer etnia ou credo – de uma maneira mais lenta e perversa. O desemprego, poderosa e real entidade, configura-se como o carrasco que com o seu chicote, a obrigatoriedade do sujeito aprender alguma novidade tecnológica e assim adaptar-se ao mercado de trabalho, à sociedade administrada, golpeia constantemente o escravo que não tem idéia da sua condição de escravo. O humano tornou-se mais sujeito para enquadrar-se em uma nova forma de aprisionamento, é o "escravo voluntário", obrigado a trabalhar na sociedade de trabalho que o ilude com a concepção de que ter um bom emprego é algo de uma naturalidade cósmica. Se quiser não posso ter um emprego, mas se o fizer não posso gozar daquilo que o Direito Humanitário insiste em deflagrar como universal. Essa nova forma de escravização caçoa desse devaneio universal. Uns ainda propagam que o trabalho dignifica o homem, mas quem dignifica o homem senão ele mesmo? De que me serve um trabalho que me é obrigatório, que conspurca gota à gota o meu espírito, o meu ser, a minha vontade de viver? Tudo nessa sociedade do trabalho está voltado para o trabalho, nem o lazer que desembocaria em um deleite consegue fugir de tal condição. Até os programas de divertimento, de entretenimento, de simples e necessária diversão estão todos direcionados para um divertimento lapidado que possui como único objetivo renovar as energias ou dar um pouco mais de energia a esse trabalhador sem consciência de si para re-ingressar em mais uma semana enfadonha, com aquele chefe que o persegue, com aquele salário que mais o afasta da alegria de viver – se é que ele pode se dar a esse luxo – acreditando que tal situação é sintomática de um momento melhor que está por vir em sua vida sem sentido. Absolutamente nada é gratuito. O seu instinto é sacrossantamente exercitado dia-a-dia obrigando-o a esquecer de que ele nasceu sim com uma incrível capacidade de transformação das coisas e do mundo que o esbofeteia.

O objetivo da vida é ser feliz?

  Decerto a experiência humana nos impõe uma ideia de que tanto o prazer como um estado de felicidade associados de algum modo devem ser tom...